segunda-feira, março 15, 2010

Trem(e)




Foi o comboio que te trouxe,
Na explosão desmedida de um sonho

Na carruagem deitada,
Foi ele que te trouxe
Deixando-te um pouco sem nada,
Na desmaterialização, no sem energia,
No que quer que fosse
Foi o comboio que te trouxe,
Devolvendo-te a um último final
A um canto, a uma doença,
Foi o comboio que te trouxe
E nem deste por isso, afinal
Era tudo uma trama dentro de uma outra trama,
Só mais uma trama dentro de mais uma outra trama
Um enredo de medo, e não, por acaso não me perdeste,
Foi ele que te trouxe
E é ele que te chama,
Agora morrer e viver parece ser fácil, o mais fácil,
Foi o comboio que te trouxe,
Agora quando choras sabe a chuva
E porém a chuva não sabe de ti,
Não é estranho a carruagem percorrer-te
Os membros, de saudade, atropelar-te?
Acorda. Foi só mais uma trama dentro de mais uma outra trama,
Podes chorar e mentir, tu não sentes o sabor das nuvens,
Ou quando vens, redesenhar o teu futuro
Aqui, sob o calor, sobre a plataforma,
À espera que ele te traga, que te devolva,
À espera que alguém te acorde e diga: sonha.

quarta-feira, março 10, 2010

Caleidoscópiasente






Duas cadeiras.





Eu oiço. Tu ouves-me.



(e então?)





Eu falo. Tu finges que falas.





(silêncio)





Silêncio.





E eu sou a casa. Tenho a mão nos quadros acastanhados, que vigentes, que amarelados. O corredor pequenino pequenino, espectros de memórias. Memórias?





(memórias)





Onde?





(aqui)





Já não.





(então?)





Imagina que o Sol desaparecia, muito muito tempo, demasiado tempo, que sim, o Sol também fingia.





(suspiro)





Pois. Já lá vai num bolso fundo, esqueci-me.





(do Sol?)





Silêncio





(silêncio)





Silêncio.





De mim.





(silêncio).





Uma cadeira.



Eras pequenina e arrebitada, não gostavas do corredor porque era escuro e estreito, fazia-te confusão os gatos serem tão quietos e carrancudos e sossegados. Mas lá vinhas toda desengonçada sentar-te ao meu colo, com o Sol na mão, abraça-me que é tarde. Abraça-me que os quadros são mentirosos, abraça-me que assim não berro, que assim sou eu.

Caleidoscópiasente, segredaste-me.
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